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Amadores no pódio: precisamos falar sobre a Maratona de Boston 2018!

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A terceira segunda-feira do mês de abril é marcada por um dos eventos mais emblemáticos do calendário de corridas de rua: a Maratona de Boston, uma das “Majors” e principais percursos de 42km do mundo!

Primeira colocada entre as mulheres, Desiree Linden cruza a linha de chegada (Reprodução / Twitter @SInow)

Nos EUA, a data é um feriado – é quando eles celebram o Dia do Patriota. Aqui, no entanto, eu estava trabalhando normalmente enquanto a prova acontecia. Até que meu marido, que estava em casa “de molho”, me mandou uma mensagem no WhatsApp: Tô assistindo à maratona. Um corredor amador tá ganhando. Japonês.

Aí eu fiquei com aquela cara de “Quêêê???” olhando para a tela do celular. Não acreditei de primeira. “Em que km ele tá?”, perguntei. Tá no final. Boston Street. Eu mal tive tempo de olhar o percurso da prova para saber onde ficava a tal Boston Street (que na verdade se chama Boylston Street, rs) quando o César me avisou: Venceu.

Car****! Fui correndo pro Twitter e vi a foto do Yuki Kawauchi. Acho que nem ele estava acreditando.

Kawauchi conquistou o primeiro lugar com tempo de 2:15:54. Deixou para trás grandes nomes do esporte, que sofreram diante das condições climáticas nada favoráveis da edição deste ano: muita chuva, frio e ventos de 35 km/h testaram não só o físico, mas a mente dos corredores. E olha que o percurso dessa prova já não é dos mais fáceis.

Entre as mulheres, a ganhadora foi a norte-americana Desiree Linden, concluindo a prova em 2:39:54. Há muito tempo uma atleta dos EUA não ganhava essa prova, e nesta edição sete americanas ficaram no top 10.

É amador ou não é?

Enquanto os comentaristas da prova exaltavam o fato de um corredor amador ter ganhado uma maratona tão prestigiada, a internet já começava a debater furiosamente: afinal, Kawauchi é ou não é um corredor amador?

Entre os que defendem que ele não é amador, os argumentos são: Kawauchi largou na elite. Ele estava vestindo um “uniforme” da Asics – inclusive, a conta oficial da marca no Brasil fez um post parabenizando o atleta. Ele já tem 70 maratonas no currículo (só este ano, foram três antes da prova em Boston) e subiu ao pódio outras vezes. E um fato curioso: ele tem como meta pessoal correr 100 provas abaixo de 2h20 até as Olimpíadas de Tóquio, em 2020.


Por outro lado, o japonês não faz da corrida seu principal meio de vida. Isso é o que defendem aqueles que afirmam que ele é um atleta amador sim, apesar de ser um corredor de elite. Kawauchi é funcionário público no Japão e teria de abrir mão de seu emprego (de tempo integral) caso aceitasse o patrocínio de uma marca, por isso recusou ofertas e segue treinando nas horas vagas e por conta própria. Ele corre pela paixão de correr e, em uma prova atípica, conseguiu o que muitos achavam impossível, colocando seu nome na história.

O que define um corredor de elite são os tempos que o atleta conquistou em outras provas e não o tamanho nem a quantidade de logotipos em sua roupa. Por isso, apesar de todo atleta profissional ser de elite (ou espera-se que seja, rs), nem todo atleta de elite é um corredor profissional.

A enfermeira que foi acompanhar o irmão – e conquistou o 2o lugar entre as mulheres!

Para se qualificar para uma das 30 mil vagas da Maratona de Boston, é preciso que o corredor já tenha completado uma maratona antes dentro de um tempo limite – o famoso “índice”. Uma mulher com menos de 35 anos, por exemplo, precisa ter corrido os 42km em, no máximo, 3h35min, enquanto o índice para homens da mesma faixa etária é de 3h30min. (A outra opção é conseguir uma das vagas cedidas a instituições beneficentes, mas além de serem poucas, é preciso desembolsar um bom dinheiro em doações, por isso não é tão comum.) Essa “nota de corte” ajuda a explicar o perfil dos participantes da prova; por mais que sejam corredores amadores, são corredores rápidos.

Se o vencedor da prova deixou dúvidas quanto ao fato de ser ou não um profissional, a segunda colocada entre as mulheres coloca mais lenha nessa história: Sarah Sellers também é uma “amadora” e estava correndo sua segunda maratona oficial. Enfermeira de profissão, Sellers se inscreveu na prova para acompanhar o irmão mais novo e acabou levando a vice-liderança.

A até então desconhecida Sarah Sellers, segunda colocada entre as mulheres

Assim como Kawauchi, ela trabalha em tempo integral, cumprindo turnos de 10 horas como enfermeira especialista em anestesia. Seus treinos eram feitos antes do trabalho, às 4 da manhã, ou depois, às 7 da noite. Ao fazer sua inscrição, pela qual ela pagou 180 dólares, ela afirma que nem pensou em solicitar uma vaga entre as corredoras de elite. Porém, como ela tinha um tempo excelente na maratona que a qualificou para Boston, os organizadores optaram por colocá-la na largada das 9h32 da manhã, junto com as corredoras de elite, e não na primeira bateria, que só sairia às 10h. É por isso, também, que ela tem seu sobrenome no BIB e não um número, como os corredores comuns.

O tempo final de Sarah foi 2:44:04bem rápido para uma amadora, mas ainda longe das marcas de uma atleta profissional ou olímpica de destaque, que correm para 2h20. Apenas como referência, se ela tivesse participado da Maratona dos Jogos Olímpicos do Rio, ela teria ficado em 73º lugar com esse tempo (isso olhando apenas para o tempo e desconsiderando, é claro, o fato de serem percursos e climas totalmente diferentes). O clima adverso, aliás, foi um dos elementos surpresas que, segundo ela, a ajudaram a conquistar esse resultado tão inusitado. Enquanto atletas consagradas sofreram com a chuva, o vento e o frio, Sarah conseguiu fazer a segunda parte da prova mais rápido do que a primeira!

A atleta já corre há algum tempo e se destacou em algumas provas durante a universidade, mas nada que a colocasse em evidência como agora. Os 75 mil dólares do prêmio serão usados para pagar seu financiamento estudantil e agora ela quer baixar seu tempo para 2h37 – o que a permitiria se qualificar para as classificatórias das próximas Olimpíadas. De qualquer forma, como Kawauchi, ela não pretende abandonar sua profissão como enfermeira para se dedicar integralmente ao esporte.

“Vou acordar e isto vai ser tudo um sonho” – Sarah Sellers

A Maratona de Boston 2018 realmente surpreendeu e levantou muitas questões sobre o treinamento dos corredores profissionais de elite. Será que, de alguma forma, esse treinamento “falhou” diante de condições tão adversas? Também trouxe muitos comentários sobre como a gente precisa focar no que gosta e treinar com empenho, que todo mundo pode “chegar lá”.

Diz o ditado que não podemos julgar ninguém sem antes “caminhar uma milha com seus sapatos”. Não sabemos como é o dia a dia de nenhum desses corredores, do que eles precisam abrir mão para equilibrar o trabalho com os treinos e conquistar tempos como estes, com que tipo de rede de apoio eles contam (da família, dos amigos…) ou se realmente o preparo mental e emocional acabou vencendo o preparo físico nessa prova. Mas com certeza faz a gente pensar…

Calma, não acho que a vitória Kawauchi nos dá esperança de um dia ganhar uma maratona #paz😂. A prova masculina de ontem em Boston, no entanto, despertou muitos sentimentos dentro da gente. Existe um conceito em inglês chamado BIRGing (Basking in reflected glory), que é a associação que fazemos entre nós e um indivíduo de sucesso de uma maneira que nos sentimos parte daquela vitória. É o que explica o fato de nos sentirmos vitoriosos com a vitória do nosso time de futebol, mesmo sem termos nem ao menos tocado na bola do jogo. Difícil ver o Kawauchi ganhando Boston e não se sentir representado, mesmo que nunca atinjamos seus tempos, nem nunca o conheçamos ao vivo. Está certo que o fato dele ser amador tem mais a ver com o sistema japonês de profissionalismo nas corridas do que com a performance; mas saber que alguém que, como vc, trabalha 8hrs por dia, está ali liderando a maratona de Boston contra o vento, a chuva e a elite foi demais! A vitória do Yuki é o nosso despertador às 4h de segunda pra dar conta de treinar e chegar na hora no trabalho; é o nervosismo de pedir pro chefe de novo pra sair mais cedo na sexta porque tem prova em outra cidade; é aquele capote no sofá depois de treino, trabalho e treino; é o andar mancando no corredor do trabalho depois do longão de domingo; é o músculo doendo por dentro da calça enquanto estamos de frente pro computador; é aquela marmita fitness no almoço de trabalho da firma; é a paciência da família com nossa ausencia; é a esperança de que, mesmo que nunca subamos no pódio, saímos de casa todo dia em busca de uma vitória.

Uma publicação compartilhada por Correndo por ai (@correndoporai) em


E vocês, o que sentiram diante de tudo isso? Mudou alguma coisa ter esses corredores “vida real” subindo no pódio de uma prova tão prestigiada? Contem aí nos comentários!

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